terça-feira, 14 de fevereiro de 2012

Um texto que fala da Essência



"Às vezes é preciso recolher-se. O coração não quer obedecer, mas alguma vez aquieta; a ansiedade tem pés ligeiros, mas alguma vez resolve sentar-se à beira dessas águas. Ficamos sem falar, sem pensar, sem agir. É um começo de sabedoria, e dói. Dói controlar o pensamento, dói abafar o sentimento, além de ser doloroso parece pobre, triste e sem sentido. Amar era tão infinitamente melhor; curtir quem hoje se ausenta era tão imensamente mais rico. Não queremos escutar essa lição da vida, amadurecer parece algo sombrio, definitivo e assustador. Mas às vezes aquietar-se e esperar que o amor do outro nos descubra nesta praia isolada é só o que nos resta. Entramos no casulo fabricado com tanta dificuldade, e ficamos quase sem sonhar. Quem nos vê nos julga alheados, quem já não nos escuta pensa que emudecemos para sempre, e a gente mesmo às vezes desconfia de que nunca mais será capaz de nada claro, alegre, feliz. Mas quem nos amou, se talvez nos amar ainda há de saber que se nossa essência é ambigüidade e mutação, este silencio é tanto uma máscara quanto foram, quem sabe, um dia os seus acenos."

Segundo Heráclito, o fluxo permanente define a harmonia universal. Tudo se move, nada se fixa na imutabilidade. Ele costumava repetir uma frase que se tornou célebre – ninguém pode entrar duas vezes no mesmo rio, pois quando nele se entra novamente, não se encontra as mesmas águas, e o próprio ser já se modificou. Assim, tudo é regido pela dialética, a tensão e o revezamento dos opostos. Portanto, o real é sempre fruto da mudança, ou seja, do combate entre os contrários. Para este filósofo, a dialética pode ser exterior – um raciocínio de dentro para fora – e imanente do objeto – quando se foca na observação atenta do ser. Heráclito entende este processo dialético como um princípio. 

Deste conflito entre os opostos é que nasce a concórdia, a harmonia. Isto permite que o Ser seja uno ao mesmo tempo em que se encontra mergulhado nas constantes mutações do contexto que o envolve. Ele ainda afirma que os contrários ocupam perfeitamente o mesmo espaço, simultaneamente, como o início e o final de uma esfera. Partindo destes postulados, Heráclito estabeleceu uma ‘arché’, ou seja, uma origem de tudo que há – o fogo, para ele o elemento primordial entre os outros que constituem o universo: água, terra, ar. Sob seu ponto de vista, esta substância transmuta-se em tudo que existe, assim como tudo nela se transforma – percebe-se, assim, um fluxo constante de mutação. 

É assim que percebemos elementos de notável semelhança na essência dos seres humanos, expressões e modos característicos próprios da espécie. Podemos encontrar formas psíquicas no indivíduo que ocorrem não somente em seus ascendentes mais próximos, mas em outras épocas distantes de nós milhares de anos e às quais estamos ligados apenas pela arqueologia. Jung coloca estas Semelhanças Essenciais do ser humano como certas formas típicas de comportamento característico, os quais, ao se tornarem conscientes, assumem o aspecto de representações do mundo, maneiras humanas de representar a realidade.

Lia Lufty

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